Existem coisas que não devem ser lembradas, mas elas doem, e
por mais que a gente coloque toda a maquiagem do mundo, no fundo, sabemos que
ali por baixo do disfarce tem uma cicatriz, tem uma parte do seu corpo
modificada, tem um pedaço seu que foi alterado. Existem certas dores que
devemos tentar afogar numa mistura louca de álcool com remédios, ou em um
abraço, ou num outro corpo qualquer. Mas aquela sutura não vai parar de
sangrar, por mais que você tente amenizar as coisas, certos cortes feito a
navalha nunca param de sangram, e fazer de uma forma masoquista você se lembrar
que ela está ali, vermelha, ardente e olhando fixamente para o seu
coração. Amanhã tudo se resolve, mas
hoje tudo faz um sentido incomum, faz as coisas parecerem mais vazias e cinzas.
Amanhã tudo se esquece, a gente finge uma amnesia normal, mas hoje, aonde quer
que ande, o que quer que diga ou faça, vai fazer doer, vai arrebentar, vai invadir sua alma como uma tempestade violenta e sedenta por destruição. Hoje,
aproveitem e taquem pedras, usufruam da minha dor, se alimentem, malditos
corvos, rebentem meu corpo para bicar meu coração. Só mais 24 horas e eu vou
ressuscitar, só mais uns instantes até tudo não existir mais e acordarmos em
outro mundo, numa ligação diferente, a da memória, aquela parte de coisas ruins
que nos fortaleceram. Olha você ai! Escondido em algum lugar dentro de mim!
Olha o dia 23 é como um novo plano, um muro em branco, pronto para ser pintado,
com vontade de atrair as pessoas! Olha toda essa culpa, toda a dor, toda a
decepção. Olha todos os sentidos, é pouca saliva para muita cara de pau! Não se
culpe, até cacos de vidros emitem um brilho mágico, até o vermelho de sangue,
tem uma coloração forte, que transmite pavor e vingança. Não se odeie, cuidado
para não engasgar com seu próprio desprezo. Amanhã tudo será curado e não
haverá mais nada com o que se preocupar. Hoje, odeiem-me, lembrem-se daquela
assassinada, daquela parte que fora enforcada em praça pública. Mas elas ainda
está aqui, e há um fantasma vagando por seu vazio que não a deixa fraquejar,
não a deixa ser invisível, não a deixa desistir e por mais que ela não queira,
está ali, pintada de vermelho, com a cara a mostra numa moldura. Uma obra de
arte, feita no dia 22.
Amanhã é 23.
Odeiem-me se quiser. O pior já passou.
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